27.4.07

177

estou cansado de detestar sempre as mesmas coisas

e no entanto elas permanecem detestáveis

e ao alcance de minha vista

ou de minha lembrança

não deixo de vê-las

meu cotidiano parece que se converteu em contorná-las

sem nunca esquecê-las

um comportamento recorrente que torna tudo igualmente insípido

começando pela necessidade de escolher a cada instante

entre o abismo e o paredão

chamam isso de livre arbítrio

esta brincadeira pesada

que um dia machuca

e mesmo que depois venha uma alma boa socorrê-lo não há curativo que feche a ferida

não há ferimento visível

você está perfeito

pronto para o amor

e no entanto

lá por dentro é só um monte de escombros

e o vício da solidão

e o olhar obsessivo

que sabe muito bem que nada vai ver

mas que ainda assim olha

fixo duro estático

para a infinita parede branca