3.6.07

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não sei o que pensa quem tem poder

talvez nunca saiba

e isso me doerá

pois não me importa assumir novos ônus

aceito riscos intoleráveis

a título de farejar a felicidade

aceito viver longe da paz

apenas em troca da admiração geral

aceito qualquer dor

que me deixe longe da dor essencial

da qual nunca estarei distante

sobre a qual nem quero mais pensar

que o fato de não esclarecê-la

converteu-se em tédio

numa cansativa martelação cotidiana

que é nada vezes nada

a ocupar-me espaço

e estes parcos neurônios que ainda são meus

que ainda não se tornaram feudo do estado nem das empresas

não tenho muito espaço para pensar

vá lá que também não tenho muitos pensamentos

mas não gosto de sentir-me loteado

não gosto de ser parte deste processo de reciclagem que me faz de uso comum

eu devia pedir só um pouco de paz

desde que não fosse a paz sem graça das igrejas