9.4.08

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é tão estranho viver neste mercado sem fronteira

de uma hora para outra posso ser mercadoria

e tudo pode ser ainda pior

posso ser posto à venda e pode ser que ninguém me queira

muito possível que eu vire encalhe

craca de prateleira

o mais terrível talvez seja isto

saber que não se serve nem como coisa de comércio

sentir que não se tem direito nem ao canto mais escuro e apertado do mostruário

o esquecimento é como uma espiral infinita

não passa de volta sobre volta

de certo só o fato de não haver retorno

senão como lembrança do que não aconteceu

senão como impressão de que não se viveu

uma voz que fala lá dentro bem dentro

só para o mundo não ouvi-la

só para seu hospedeiro ter aquela estranha sensação

de ouvir coisas

que não lhe dizem respeito

embora lá dentro